Teletrabalho e a crise do novo coronavírus: medidas trabalhistas

Desde que iniciou o avanço da contaminação pelo novo coronavírus – COVID 19, os governos municipais, estaduais e federais têm editado inúmeras normas jurídicas, inclusive com o objetivo de proporcionar o isolamento social, uma vez que se trata de medida que tem sido preconizada como a mais efetiva na prevenção da expansão da doença.

Muitas empresas tomaram medidas internas no sentido de reduzir o número de empregados em circulação, embora todas estivessem, de fato, na expectativa de que o Presidente da República publicasse Medida Provisória para disciplinar o assunto de forma a eliminar ou, ao menos, reduzir o cenário de insegurança jurídica.

No dia 22/03/2020 foi publicada a Medida Provisória nº 927 que trouxe uma série de medidas que poderão ser adotadas pelos empregadores– sem prejuízo de outras albergadas pela legislação – para o enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes de toda a situação.

No art. 3º da MP nº 927/2020, foram indicadas as seguintes medidas que poderão ser adotadas pelos empregadores, entre outras: 1) teletrabalho; 2) antecipação de férias individuais; 3) concessão de férias coletivas; 4) aproveitamento e antecipação de feriados; 5) banco de horas; 6) suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; 6) direcionamento do trabalhador para qualificação e 7) diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

Abordaremos os principais tópicos da Medida Provisória mencionada em vários textos, de forma a se tornar mais fácil a sua consulta.

No presente texto, será abordada a situação relacionada ao Teletrabalho.

Do Teletrabalho

O regime de teletrabalho já estava previsto nos arts. 75-A a 75-E da CLT. No entanto, a MP nº 927/2020 trouxe, no seu Capítulo II, ao longo do art. 4º e seus parágrafos, algumas modificações no que diz respeito ao regramento respectivo durante o regime de calamidade pública.

Pode-se apontar o seguinte quadro comparativo entre as previsões da CLT e as inovações trazidas pela Medida Provisória.

A definição do que se deve considerar como teletrabalho é similar à prevista no artigo 75-B da CLT.

A mudança diz respeito ao fato de que na CLT se previu que o teletrabalho ocorre preponderantemente fora das dependências do empregador; já a Medida Provisória previu que esse regime se aplica à “prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo”.

A Medida Provisória esclareceu, ainda, que os termos “teletrabalho”, “trabalho remoto” e “trabalho a distância” são equivalentes desde que a sistemática de labor seja a acima definida.

Enquanto na CLT está previsto que é necessário que a mudança do regime presencial para o regime de teletrabalho conste de aditivo contratual, a MP nº 927/2020 prevê que o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho de presencial para o teletrabalho.

Em outras palavras, bastará uma comunicação ao empregado por escrito ou por meio eletrônico, com 48 (quarenta e oito) horas, no mínimo, de antecedência (§ 2º), não sendo necessária assinatura de aditivo contratual.

Em relação ao retorno ao regime de trabalho presencial, diversamente da CLT que prevê necessidade de aditivo contratual e um período de transição mínimo de 15 dias, a MP nº 927/2020 dispensa o aditivo contratual, prevendo que o interstício entre a comunicação do empregador e efetivo retorno ao regime presencial, será de 48 (quarenta e oito) horas, no mínimo, ( 2º).

Ou seja, o prazo de 48 horas é aplicável tanto à determinação para adoção do regime de teletrabalho como para o retorno ao regime presencial.

No que diz respeito à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, permanece a exigência de previsão em aditivo contratual.

No entanto, a MP nº 927/2020 previu que esse aditivo poderá ser firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da mudança do regime de teletrabalho.

O pagamento dos serviços de infraestrutura necessária à prestação do teletrabalho por parte do empregador não tem natureza salarial, permanecendo a orientação de que o eventual fornecimento de equipamentos não integra a remuneração do trabalhador.

A MP previu que, na hipótese do empregador fornecer os equipamentos ao empregado, assim o fará em regime de comodato (empréstimo gratuito), o que deverá constar no aditivo contratual que será celebrado, com indicação específica de todos os equipamentos.

No entanto, a MP previu que (i) se o empregador colocar o trabalhador em regime de teletrabalho, (ii) o empregado não possuir equipamentos próprios e (iii) a empresa não fornecer os equipamentos em regime de comodato, o período da jornada normal do empregado (aquela prevista em contrato de trabalho) será computado como tempo à disposição do empregador, ou seja, será considerado como se ele estivesse trabalhando normalmente com direito à sua remuneração.

As disposições previstas no Capítulo II (Da Duração do Trabalho) do Título II (Normas Gerais de Tutela do Trabalho) da CLT não são aplicáveis aos empregados em regime de Teletrabalho (art. 62, III da CLT), de forma que não são aplicáveis as normas sobre:

  • o regime sobre jornada de trabalho – Seção II- (arts ex: de horas extras, compensação de jornada);
  • os períodos de descanso – Seção III –(ex. intervalos intrajornada ou interjornada);
  • o trabalho noturno – Seção IV – (ex. duração do trabalho noturno e adicional noturno);
  • Quadro de Horário – Seção V – (ex. exigência de registro de jornada).

Certamente por esse motivo, a MP 927/2020 previu que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo ( § 5º, art.4º).

Finalmente, a MP nº 927/2020 permitiu expressamente a adoção do regime de teletrabalho para estagiários e aprendizes, nos termos do disposto no art. 4º.

Permanecem as recomendações de que os empregadores deverão instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, devendo o empregado assinar termo de responsabilidade com o compromisso de seguir as instruções fornecidas pelo empregador.