Prorrogação de acordo ou convenção coletiva e outras disposições em matéria trabalhista previstas pela Medida Provisória nº 927/2020

Através desse texto, passa-se à análise dos demais dispositivos do Capítulo “X” (“Outras disposições em matéria trabalhista”) que não foram objeto dos textos anteriores já postados neste site, bem como do Capítulo XII (“Disposições finais) da MP nº 927/2020, nos pontos que merecem destaque.

A mencionada Medida Provisória entrou em vigor na data de sua publicação (DOU de 22/03/2020). Isso não obstante, o seu artigo 18 versando sobre “direcionamento do trabalhador para qualificação” foi revogado pela MP nº 928 de 23/03/2020, de forma que é desnecessário abordar o tema tratado no referido dispositivo.

 SUSPENSÃO DOS PRAZOS NO ÂMBITO DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS

Além das medidas que poderão ser adotadas pelo empregador detalhadas ao longo da norma, algumas exigências de ordem administrativa e no âmbito do direito coletivo foram suspensas e/ou alteradas durante o estado de calamidade.

O artigo 28 da MP nº 927 de 2020 prevê que, durante o período de 180 (cento e oitenta) dias, contado da data de entrada em vigor da Medida Provisória, os prazos processuais para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS ficam suspensos.

Assim, a referida previsão ratifica os princípios da ampla defesa e garantia ao contraditório, uma vez que a paralisação das atividades de modo geral, decorrente da decretação do estado de calamidade poderia prejudicar a adequada apresentação de defesa ou medida recursal pelo autuado.

DA PRORROGAÇÃO DOS ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVOS

A CLT, no § 3º do art. 614 (com redação dada pela Lei 13.467/2017), veda estipular duração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho superior a dois anos, bem como a ultratividade da respectiva norma (prorrogação automática).

Antes da edição da MP nº 927/2020, não havia possibilidade de prorrogação das normas coletivas por decisão única do empregador, porquanto o art. 615 da CLT determina expressamente que a “prorrogação, revisão, denúncia ou revogação total ou parcial de Convenção ou Acordo ficará subordinado, em qualquer caso, à aprovação de Assembleia Geral dos Sindicatos convenentes ou partes acordantes”.

Com a edição da MP nº 927/2020 as determinações contidas nos citados dispositivos da CLT ficaram mitigadas, em razão do período de enfrentamento ao estado de calamidade, de modo a possibilitar a prorrogação, a critério do empregador, de acordos e convenções coletivas em determinadas situações.

De fato, a MP citada previu, no artigo 30, que:

Art. 30.  Os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias, após o termo final deste prazo.

A redação do dispositivo não primou pela clareza, de forma a suscitar dúvidas na sua interpretação.

Com relação às convenções e acordos coletivos que irão vencer no prazo de 180 dias, a partir da publicação da MP, parece claro que existe a possibilidade de se prorrogá-los a critério do empregador, por até 90 dias, após esse termo final de 180 dias (contados da data da publicação da MP). Ou seja, à medida que foram perdendo sua vigência, essas normas coletivas poderão ser prorrogadas até 17/12/2020.

A maior dúvida reside no que a MP em questão quis dizer com a possibilidade de prorrogação de acordos e convenções coletivas vencidos.

No particular, poderá haver o entendimento de que os acordos e convenções coletivas cujos prazos de vigência terminaram até o dia 22/03/2020 (data da publicação da MP) e que não foram sucedidos por novos instrumentos normativos, poderão ser prorrogados desde logo, a critério do empregador, para vigorar até 90 dias após transcorrido 180 dias. Ou seja, poderão ser prorrogados até o dia 17/12/2020

Por outro lado, a redação também pode levar ao entendimento de que, no que diz respeito à menção às convenções e acordos coletivos vencidos, apenas aqueles que se venceram no dia 22/03/2020 (data da publicação da MP) poderão ser prorrogados, a critério do empregador, por até 90 dias, após esse termo final de 180 dias. Por esse entendimento, as normas coletivas vencidas anteriormente à publicação da MP não poderão ser prorrogados pela sistemática por ela instituída.

Os prazos fixados na MP nº 927/2020 são coerentes com o quadro de emergência de saúde pública vivenciado no país, durante o qual estarão restritas as possibilidades de se realizar as reuniões entre os representantes dos sindicatos e das empresas para discussões em torno dos termos das convenções e acordos coletivos a serem firmados, bem como as assembleias necessárias para aprová-los.

DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO NA MEDIDA PROVISÓRIA

A Medida Provisória nº 927/2020, em seu artigo 32, previu que o quanto disposto ao longo da norma também se aplica às relações de trabalho especiais regidas:

– pela Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que trata do Trabalho Temporário e da prestação de serviços a terceiros, conforme dispositivos nela introduzidos pelas Leis 13.429/17 e 13.467/17.

– pela Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973,   que estatui normas reguladoras do trabalho rural.

– no que couber, pela Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015, que dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico.

Com relação a esta última categoria, a norma exemplifica a aplicabilidade das normas relacionadas ao banco de horas, jornada e férias. 

DISPOSIÇÕES FINAIS 

Entre as disposições finais da MP 927/2020, o artigo 36 considerou convalidadas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores, no período de trinta dias anteriores a 22/03/2020, que não contrariem o quanto nela disposto.

Tal previsão certamente decorre do fato de que o avanço da contaminação pelo novo coronavirus levou a que muitos empregadores, com o objetivo de tomar medidas de cautela à saúde dos empregados, adotassem inúmeras providências que, no momento, não estavam previstas na legislação.

Portanto, as medidas tomadas pelas empresas que passaram a ser previstas na Medida Provisória sob comento, se adotadas no período de 30 dias anteriores a 22/03/2020, são consideradas como convalidadas.

 

 

*Este texto foi produzido por Priscila Vasconcelos de Melo Vieira, com a colaboração de Ana Cláudia Guimarães Vitari e Ana Cristina Costa Meireles, sócias de Guimarães e Meireles Advogados Associados S/C