Medida Provisória nº 1046/2021: Teletrabalho, Banco de Horas e Outras Medidas

Foi publicada em 28/04/2021, a Medida Provisória nº 1046/2021 dispondo sobre medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores durante o prazo de 120 dias contados da data da sua publicação, com possibilidade de prorrogação por ato do Poder Executivo Federal   

Em seus dispositivos, houve previsão de medidas trabalhistas para o enfrentamento das consequências da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do COVID 19, no âmbito das relações de trabalho. 

Anteriormente, medidas similares foram instituídas através da medida provisória nº 927/2020, vigente entre 22/03/2020 e 19/07/2020, não convertida em Lei. 

No art. 2º da MP nº 1046/2021, foram indicadas as seguintes medidas que poderão ser adotadas pelos empregadores, entre outras: 1) teletrabalho; 2) antecipação de férias individuais; 3) concessão de férias coletivas; 4) aproveitamento e antecipação de feriados; 5) banco de horas; 6) suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; 7) diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. A partir do artigo 27, foram arroladas outras disposições, tais como: 1) Prorrogação de jornada em estabelecimentos de saúde; 2) Permissão de meios eletrônicos para convocação, deliberações, publicidade de convenção ou acordo coletivo de trabalho. 

Abordaremos em quatro tópicos oseguintes temas: Teletrabalho, Férias Individuais e Coletivas, Aproveitamento e Antecipação de Feriados e Banco de Horas 

  1. Teletrabalho

O regime de teletrabalho já estava previsto nos arts. 75-A a 75-E da CLT. No entanto, a MP nº 1046/2021 (tal como a MP 927/2020), trouxe,  ao longo do art. 3º e seus parágrafos, algumas modificações no que diz respeito ao regramento respectivo durante o regime de emergência de saúde pública de importância internacional 

Já apontamos detalhadamente em texto anterior o comparativo entre as previsões da CLT e as inovações trazidas pela Medida Provisória ao qual remetemos (https://guilink.guimaraesemeireles.com.br/ev/PHtI8/e/6ab6/JzKEgEf4YqA/BLE1/, uma vez que seu texto é muito similar.  

Destacamos, entretanto, os principais pontos da MP 1046/2021: 

  • empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho de presencial para o teletrabalho, por comunicação de no mínimo 48 horas de antecedência (§ 2º), não sendo necessária assinatura de aditivo contratual; 
  • Para o retorno ao regime de trabalho presencial, basta a comunicação prévia de 48 horas, do empregador ao empregado; 
  • Necessidade de aditivo contratual sobre a responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, que poderá ser firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da mudança do regime de teletrabalho. 
  • O pagamento dos serviços de infraestrutura necessária à prestação do teletrabalho por parte do empregador não tem natureza salarial, permanecendo a orientação de que o eventual fornecimento de equipamentos não integra a remuneração do trabalhador. 
  • Na hipótese do empregador fornecer os equipamentos ao empregado, assim o fará em regime de comodato (empréstimo gratuito), constando no aditivo contratual, indicação específica de todos os equipamentos. 
  • Previsão de que (i) se o empregador colocar o trabalhador em regime de teletrabalho, (ii) o empregado não possuir equipamentos próprios e (iii) a empresa não fornecer os equipamentos em regime de comodato, o período da jornada normal do empregado (aquela prevista em contrato de trabalho) será computado como tempo à disposição do empregador, ou seja, será considerado como se ele estivesse trabalhando normalmente com direito à sua remuneração.  
  • tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo § 5º, art.4º). 
  • As disposições previstas no Capítulo II (Da Duração do Trabalho) do Título II (Normas Gerais de Tutela do Trabalho) da CLT não são aplicáveis aos empregados em regime de Teletrabalho (art. 62, III da CLT), quais sejam: (i)  regime sobre jornada de trabalho; (ii) os períodos de descanso; (iii) o trabalho noturno; (iv) Quadro de Horário e registro de ponto; 
  • Permissão para a adoção do regime de teletrabalho para estagiários e aprendizes, nos termos do disposto no art. 4º.  
  • Os empregadores deverão instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, devendo o empregado assinar termo de responsabilidade com o compromisso de seguir as instruções fornecidas pelo empregador. 

 

  1. Férias Individuais e Coletivas 

O direito às férias está regulado nos artigos 129 e seguintes da CLT e a MP 927/2020durante seu período de vigência, trouxe disposições especificas nos artigos 6º a 12º,  sobre férias individuais e coletivas, objeto de texto anterior (https://guilink.guimaraesemeireles.com.br/ev/PHtXP/e/2f7e/JzKEgEf4YqA/BLE1/) 

A MP 1046/2021 também trouxe algumas modificações ao longo dos arts. 6º a 10º e seus parágrafos, no que diz respeito ao regramento das férias individuais e, nos artigos 11º a 13º, quanto às férias coletivas. 

Destacamos que a MP 1046/2021 trouxe disposição expressa no parágrafo único do art. 10 no sentido de que “As férias antecipadas gozadas cujo período não tenha sido adquirido serão descontadas das verbas rescisórias devidas ao empregado no caso de pedido de demissão, previsão esta que não havia na MP 927/2020 e que suscitava dúvidas sobre tal possibilidade.  

Também, restou esclarecida com a redação do artigo 11º a possibilidade de concessão de férias coletivas a todos os empregados ou a setores da empresa, bem como que a notificação com antecedência mínima de 48 horas ao conjunto de trabalhadores afetados pode-se dar por escrito ou por meio eletrônico.  

Ainda, no artigo 11º da MP 1046/2021, restou expressamente permitida concessão de férias coletivas por prazo superior a trinta dias, esclarecendo no artigo 12º que o disposto no § 1º do art. 5º (número mínimo), nos arts. 7º e 8º (abono), no art. 9º (prazo de pagamento), e no parágrafo único do art. 10 (desconto na rescisão) aplica-se às férias coletivas.  

2.1. Férias individuais 

Destacamos os demais pontos trazidos pela Medida Provisória 1046/2021 sobre as férias individuais durante o estado de emergência de saúde pública: 

  • Em exceção ao que dispõe a CLT sobre a concessão e época das férias individuais, a MP nº 1046/2021 estabeleceu que as férias individuais (i) poderão ser antecipadas, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido, (ii) mediante informação do empregador ao empregado com antecedência mínima de 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado; 
  • Foi mantida a previsão da CLT de que férias não poderão ser gozadas em períodos inferiores a cinco dias corridos; 
  • Empregado e empregador poderão negociar a antecipação de períodos futuros de férias, mediante acordo individual escrito;   
  • Diversamente às previsões dos artigos 143 e 145 sobre pagamento da remuneração de férias e abono pecuniário, a MP nº 1046/2021 prevê que pagamento das férias poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início das férias; com relação ao adicional de um terço das férias, o empregador pode optar por efetuar o pagamento após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina (até o dia 20 de dezembro de cada ano); 
  • Quanto ao abono pecuniário, direito do empregado converter 1/3 do período de férias a que tiver direito dependerá da concordância do empregador, hipótese em que seu pagamento poderá ser efetuado até data em que é devida a gratificação natalina (até o dia 20 de dezembro de cada ano) 
  • Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho, os valores ainda não adimplidos em relação às férias, serão pagos juntamente as demais verbas rescisórias. Ficou  expressamente autorizado, no caso do pedido de demissão, o desconto dos valores relativos às férias gozadas antecipadamente, cujo período não tenha sido adquirido;  
  • Ficou estabelecido que os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco de contaminação pelo coronavírus terão prioridade para o gozo de férias, individuais ou coletivas, nos termos do quanto disposto na mencionada Medida Provisória. 

 

  • Finalmente, a MP previu que, durante o estado de emergência de saúde pública, o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de quarenta e oito horas; 

 

2.2. Férias coletivas 

Quanto aos demais pontos trazidos pela Medida Provisória 1046/2021 sobre as férias coletivas durante o estado de emergência de saúde pública, destacamos: 

  • A possibilidade de concessão de férias coletivas já se encontra prevista nos arts. 139 e 140 da CLT, (i) dependendo de comunicação ao órgão local do Ministério da Economia com 15 dias de antecedência, (ii) com indicação das datas de início e fim das férias e os estabelecimentos ou setores abrangidos pela medida, bem como (iii) em igual prazo deve haver o envio de cópia da comunicação aos sindicato representativo da categoria profissional, (iv) providenciando a afixação de aviso nos locais de trabalho.  A mudança diz respeito ao fato de que durante o estado de calamidade objeto de que trata a MP em comento, o empregador poderá conceder férias coletivas e notificar o conjunto de empregadoafetados com antecedência de no mínimo 48 horas, dispensando-se a comunicação ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação ao sindicato representativo da categoria profissional.  
  • A CLT, no artigo 139, também dispõe que as férias coletivas podem ser gozadas em dois períodos anuais, desde que nenhum deles seja inferior a dez dias corridos.  Nesse ponto, de acordo com a MP 1046/2021, não se aplicam o limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos. 

 

  1. Aproveitamento e Antecipação de Feriados 

Durante o período de emergência de saúde pública internacional decorrente da Covid-19, a inexistência de trabalho em determinados dias, por instituição do empregador, representa antecipação dos feriados respectivos, caso assim determine. 

A MP 927/2020 previa no art. 13 a possibilidade de antecipação e gozo de feriados não religiosos no período de calamidade pública, condicionando, no seu parágrafo 2º, aproveitamento de feriados religiosos à concordância do empregado mediante manifestação em acordo individual escrito.  

A MP 1046/2021, entretanto, permitiu no artigo 14, caput, aproveitamento e antecipação de feriados, inclusive os religiosos, durante o estado de emergência de saúde pública, sem necessidade de concordância do empregado.  

Destacamos seus principais pontos: 

  • A instituição da antecipação do gozo dos feriados pelo empregador dar-se-á mediante notificação ao empregado, com 48 (quarenta e oito horas) de antecedência, por escrito ou por meio eletrônico. 
  • A antecipação dos feriados poderá ser utilizada para compensação do saldo em banco de horas.  
  • Vale destacar que os feriados federais são aplicáveis a todos, os estaduaisapenas nos Estados que os instituiu, os municipais, no âmbito do respectivo Município  e os  distritais (aplicáveis apenas no Distrito Federal). 
  • A previsão da norma é salutar visto que, em muitas situações, não será possível instituir o regime de teletrabalho de forma que o empregado possa continuar a desempenhar as suas tarefas normais à distância e mediante a utilização de tecnologias da informação e comunicação. 
  • No caso da instituição de feriado pelo empregador, é necessário que na comunicação respectiva, sejam indicados os dias que não serão trabalhados a título de antecipação de feriados e a indicação dos dias de feriados (civis ou religiosos) que deverão ser trabalhados posteriormente. 

 

  • Caso a empresa venha a adotar o regime de banco de horas, é certo que a inexistência de trabalho, por parte do empregado, no período indicado, constituirá um saldo negativo de horas que deverão, no prazo previsto, ser compensadas. 
  • Com essa previsão, ocorrerá, na prática, do empregado trabalhar nos feriados que forem indicados, já que estes feriados foram utilizados para quitar parte do saldo negativo do banco de horas. 

 

  1. Banco de Horas

O tema objeto da MP 927/2020 foi objeto de texto publicado no nosso site.

A MP 1046/2021, no Capítulo VI, artigo 15 e parágrafos, tratou de regime especial para o banco de horas aplicável ao período de emergência de saúde pública internacional indicado na norma valendo destacar que: 

  • No caput do art. 15, a MP 1046/2021 autorizou o empregador a interromper as suas atividades e constituir regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas em favor do empregador ou do empregado, “por meio de acordo individual ou coletivo escrito, para a compensação no prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do período de que trata o art. 1º.” (prazo de 120 dias contados da data da sua publicação, em 28/04/2021, com possibilidade de prorrogação por ato do Poder Executivo Federal).    

Com essa previsão, neste regime de compensação especial, não prevalecem as normas da CLT a respeito dos prazos de compensação em razão do banco de horas. 

  • A CLT prevê a instituição do banco de horas por acordo ou convenção coletiva ou, ainda,  por acordo individual escrito, nos §§ 2º e 5º da CLT do art. 59, respectivamente, estabelecendo que o excesso de horas em um dia, poderá ser compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano (em caso de previsão em acordos ou convenções coletivas) ou de seis meses (no caso de pactuação em acordo individual), à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite de dez horas diárias. 

Outra previsão da MP que chama atenção é a de que o banco de horas poderá se dar em favor do empregado ou do empregador (art. 15, caput). Isto quer dizer que tanto o empregado poderá trabalhar em horas que extrapolem a jornada normal (certamente será uma necessidade dos profissionais de saúde, por exemplo), como, ainda, o empregado poderá ficar sem trabalhar em determinado período em decorrência da interrupção das atividades do empregadorNesse caso, o empregado ficará “devendo” horas de trabalho ao empregador (saldo de banco de horas negativo), o que também será objeto de compensação. 

  • O § 2º do art. 15 da MP nº 927/2020 previu que a compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador, independentemente de convenção coletiva ou de acordo individual ou coletivo de trabalho. Entretanto, será necessário o acordo formal (ou seja, não poderá haver acordo tácito). 

 

  • Na hipótese de o empregado ficar com saldo de horas negativo, a compensação poderá se dar mediante acréscimo da sua jornada de trabalho em até duas horas, não podendo exceder de dez horas diárias.  

 

A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser realizada aos finais de semana, observado o disposto no art. 68 da CLT, ou seja, o trabalho em domingos dependerá da permissão prévia da autoridade competente em matéria de trabalho. 

 

  • Por fim, vale destacar que o § 3º permitiu que as empresas que desempenham atividades essenciais constituam o regime especial de compensação de jornada por meio de banco de horas, independentemente da interrupção de suas atividades. 

 

*Este texto foi produzido por Ana Cláudia Guimarãescom a colaboração de Ana Cristina Meireles, ambas sócia de Guimarães e Meireles Advogados Associados S/C